Eu queria agora que, num desses
sacos do supermercado que deixaste à pressa sobre o balcão da cozinha, e agora
revisitas por um pacote de bolachas, uma surpresa minha te fizesse sorrir.
Uma caixinha de madeira – sei lá!
– com um bonequito saltitão que te assustasse à primeira e com um gritinho
acordasse depois a vizinha de baixo – essa velha surda cujas forças mais não
servem senão para te reprovar a conduta, com baques da vassoura dela no teu
soalho – imune aos encantos do teu riso singular.
Passaste a noite de Natal sozinha
e isso doeu-me no coração. Logo a mim, que já nem gosto do Natal e privilegio a
solidão, talvez por me ser permitido optá-la…
Eu queria ter sido o teu palhaço
e passar contigo a noite a fazer-te rir, aconchegar depois um cobertor à tua
expressão feliz e ouvir-te uma última risadinha cansada por uma parvoíce que eu
tivesse dito antes de dormires…
Entraria depois no carro e faria duzentos
quilómetros até casa, na mais profunda melancolia de levar o coração cheio…
Acordarias só outra vez no dia
seguinte, com uma caixinha de música e bailarina nas tuas botas de fecho. E
saberia ter-me na tua expressão, não sei em que lado, um lugar no teu coração.