Duas
pernas mergulhadas no rio
agitam
a calma do sol a morrer a Ocidente.
O
amor não é mais do que isso:
duas
pernas irrequietas que brincam,
remexem
a água e tocam a lama,
o
fundo,
onde
estilhaços de garrafas quebradas nos cortam os pés,
enquanto
as mãos ficam livres para lançarmos pedras ao rio
e os
olhos ficam atentos à contagem do número de ricochetes
que
anotamos no velho caderno quadriculado
onde
multiplicamos todas as divisões que o mundo nos fez.
1 2 3 4 5
6
saltinhos x 1000, vi eu,
e
afundou-se a pedra filosofal à sétima milhena que beijou a água por nós.
Julgo
que isso tu também viste…
O amor
é infantil.
É uma
merda pequena quando cais ao rio
e não
és tu a tua própria foz.
Ao chegares
a casa encharcado e triste,
nunca
sabes muito bem como te deves explicar.
-
Ainda na semana passada te pus a razão a secar – diz-te a tua mãe,
zangada
e consciente das tolices que o mundo produz e reproduz.
Porque
as mães são assim e aborrecem-se com merdas pequenas.
Em
seguida, tomas um chã quente, anoitece e tentas dormir
ainda
escutando os rumores das águas.
O rio
continuará sempre lá,
tal
como as pedras e o teu caderno de contas,
e
provavelmente, com sorte, ainda terás pernas e mãos quando acordares,
basta
não despenteares a infância toda nestas noites de inverno.