fazer da escrita uma vida é como ser
recolhedor de lixo.
e não considero, de todo, este um ofício
demeritório.
o mundo precisa de uma limpeza
permanente,
e alguém tem de remexer a porcaria, esse
território olvidado.
mas penso ser legítimo que todos
queiramos uma vida melhor;
todos precisamos de um banho, rápido ou
de espuma, ao fim do dia,
de uma viragem na sorte – um sonho bom
já não é mau!
entre um recolhedor de lixo e eu a
diferença é apenas o odor,
esse que fica retido na pele.
não há sabonete azul e branco que leve o
sarro de um poema;
não há um perfume caro, um crítico
literário,
nem a vaidade que possuímos metida num
frasco,
que sempre se abre aquando de uma
leitura prazerosa,
que ornamente o aterro que somos – o
erro que reciclamos.
ambos partilhamos o cansaço do mundo
nocturno,
a vontade de dormir bem fundo,
de possuir sapatos novos, envernizados,
que toquem o acelerador de um automóvel
topo de gama,
ir para longe, Côte d’Azur, tanto faz,
mas sempre com pressa,
e jantar boeuf bourguignon num
restaurante três estrelas Michelin.
2 comentários:
Viva, meu caro. É sempre com um enorme prazer que acolhemos novos membros no seio da nossa comunidade... ainda por cima com um estreia tão auspiciosa. Um belíssimo texto, sem dúvida.
Bem-vindo!
muito obrigado pelas palavras e pela confiança!
foi com todo o gosto que me juntei a esta comunidade. desde o momento em que este blogue me foi dado a conhecer, passei a ser um visitante pontual deste cabaret. pelo tanto, é um enorme orgulho aquele que sinto agora em ser mais um dos seus mortos-vivos residentes.
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