Entro às nove
Com uma convicção que tem de durar até às cinco.
Espero uma semana,
Adio um mês,
Para o ano é que vai ser!
Vinte anos de escola
A esculpir um analfabeto sem mão
Para arrancar da terra o próprio pão.
Ganha-se depois um rosto de tristeza ao fim do dia e do fundo
E um copo com duas doses bem servidas
Para anestesiar as certezas que se tinha do mundo.
Abro depois as gavetas onde me pus arrumado
E deito fora as memórias irrelevantes para o meu passado.
Livro-me do pó, escrevo post-hits com letra bonita
E vou levar o lixo para o caixote do mundo
Com um cheiro de armário lavado,
Outra vez engavetado.
Troco de religião
E vendo os serviços do que valho a um outro patrão.
Levo para abate a furgoneta dos sonhos
E passo a andar de camião.
Troco a mulher que me ganhou os filhos
E saio a viver por baixo de uma pensão
De alimentação.
Procuro depois amor na solidão de uma puta
Sem mais coração para outra luta.
Deixo para trás um resquício de esperma sem herança
E saio para o espaço vazio sem dizer “boa noite” ao segurança.
Sinto o chão nos pés caminhando até ao carro,
E arranco para lado nenhum a fumar um cigarro.
Incorporo uma música triste a passar na rádio
E atalho voando
Para uma serenidade sem lágrimas no lábio.
Os arbustos gritam no vidro por uma estrada inventada,
O carro salta
E eu fecho os olhos para uma surdez que troca tudo
Por nada.
Virão depois buscar-me os ouvidos cheios de sangue
E a carne acessória que o distribuía com disciplina.
Silêncio sem consciência…
Ficarei nas palavras que escrevi,
Na carne que me comeu,
Na memória dos outros onde vivi.
Passarão depois dez ou duzentos anos
E a sepultura que me tiver os ossos engavetados
Dará lugar a outros estropiados.
Não valerá de nada guardarem o que fui.
Tudo morre para o que pensa o tempo,
E tudo vale para quem se beija ao vento…
Viver é sorrir amor ao momento…
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6 de jul. de 2009
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