O ser humano mais velho do mundo tem 116 anos – centi fuckin
dezasseis anos! – é muito ano a escorrer caca da tripa para o sanitário… e vai
daí, se calhar é pouco… neste imenso mundo com milhões de anos e eras e ciclos
e metamorfoses… neste mundo gigante em que somos formiguinhas e as formiguinhas
nos parecem seres inferiores e sem alma, ainda que façam o caminho de casa para
o trabalho e do trabalho para casa e coletem víveres na dispensa para
sobreviver aos Invernos…
Em boa verdade, não são muito diferentes de nós, pois não? E
que sabemos nós da sua alma, daquilo em que acreditam? Organizam-se – sabe
disso quem já viu um formigueiro em labuta. Não sabemos se falam mas é notório
que comunicam entre si. E em comunicando, deve haver entre elas, também,
divergências. Talvez arrufos. Talvez motins. Talvez entre elas… Entre elas e
eles – pois não consta que as formigas se fecundem a si mesmas por divina graça
ou por alombarem quantidades maiores de carboidratos. Deve haver gajos-formiga
também – uns, mais cabrões e importados com o bujão alheio, e outros mais
focados na fortuna do celeiro. Haverá de tudo, provavelmente, como no mundo-animal
em geral, onde somos o tubarão maior da colónia…
Talvez as formigas olhem para nós e nos não compreendam e
tudo isto que somos lhes pareça nublado e incompreensível, como nós com as duas
vistas e o pensamento botados para o espaço. Talvez as formigas acreditem em
deuses-formiga e lhes roguem uns migalhos de pão e tempo de vida. – O Tempo, lá
está… - arqui-amigo do Espaço que não compreendemos bem, também…
O ser humano mais velho do mundo tem 116 anos. Com menos anos,
são muitos os velhos a ocupar demasiado espaço, a roubar demasiado tempo. Pesa-nos
a História demasiado nos ombros com rosários de responsabilidade - uma
responsabilidade que vale pouco mais que nada e se perpetua por pudor e vaidade
sobre a existência livre.
O mundo enlouqueceu na sua fórmula!
Em ter medo de morrer sozinho, abriu a porta a ladrões
Em ter medo de enlouquecer, tomou os comprimidos todos
Em ter medo de ser esquecido, eternizou-se pela barbárie
Em ter medo da fome, comeu os frutos todos da árvore
Em ter medo dos trovões, cortou a árvore dos frutos
Em ter medo de dar, vendeu-se
Em ter medo de amar, castrou-se
Em ter medo de foder, fodeu-se.
Em ter medo da realidade, deu-se de barato à mentira
mezinha.
E em ter medo da morte, inventou Deus
Para se dar a si mesmo outra hipótese de ser feliz.
A vida não tem um sentido tão romântico como nós queríamos
que ela tivesse – nós não queríamos que ela fosse isto de caminhar para a morte,
tão habituados estamos a pensar a vida por objetivos, acelerar a leitura, dobrar
capítulos…
Perante isto, e contrariando toda a lógica do que deveria
ser um texto aberto, dignamente livre, deixado ao arbítrio de cada pessoa esgrimir
em su’alma as confusões que a oprimem, atrevo-me precipitar as minhas próprias
conclusões, poluindo-vos:
- Ser feliz, mas tão feliz que, num hipotético leito de
morte, possa ainda ter tempo de dizer, sem ficções: - ‘Puta que pariu! Valeu a
pena!’
Abrir um sorriso, fechar os olhos e deixar-me sepultar, com
expressão encerada, por baixo de um cascalho qualquer, na mesma Terra de
Nenhures de onde vim.
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